Cherreads

Chapter 71 - Capítulo 71 – Entre Ecos e Sombras

O céu começava a clarear quando Ryouma finalmente deixou a neblina para trás. A luz suave da manhã filtrava-se entre as árvores, pintando o solo com padrões dourados que contrastavam com a escuridão que ainda pairava em seu coração. A aparição de Mayumi — ou do que quer que tenha sido aquela manifestação — havia deixado marcas profundas em sua mente. Não era apenas saudade, era uma inquietação genuína, como se houvesse algo quebrado em seu caminho, algo que ele ainda não enxergava.

Mas não era hora de hesitar.

Com o corpo mais leve e a mente ainda confusa, Ryouma apertou o passo. Havia uma clareira adiante. E, além dela, uma vila simples se revelava, com telhados de madeira e fumaça subindo preguiçosamente das chaminés. Era uma daquelas aldeias esquecidas pelo tempo, onde os anciãos contavam lendas à beira da fogueira e crianças corriam entre as plantações sem se preocupar com o que havia além das montanhas.

Uma presença mais densa logo chamou sua atenção.

Um grupo de pessoas estava reunido no centro da vila. A energia era sutil, mas familiar: mestres espirituais. Ryouma não perdeu tempo. Com passos leves e a postura relaxada, mas atento a qualquer sinal de hostilidade, aproximou-se.

Os olhares se voltaram para ele.

— Você… é um viajante? — perguntou um dos homens, com vestes simples, mas o distintivo de mestre espiritual costurado no ombro.

— Algo assim — respondeu Ryouma. — Estou de passagem. Procuro abrigo e, se possível, informações sobre os arredores.

O mestre espiritual parecia avaliá-lo com atenção. Talvez sentisse a energia contida sob a superfície. Talvez apenas desconfiasse do estranho que surgira da floresta como uma sombra ao amanhecer.

— Esta vila se chama Yunlan. Não temos muito a oferecer, mas temos respeito pelos que sabem se portar — respondeu o homem, por fim. — Me chamo He Fan.

Ryouma assentiu, escondendo o quanto estava atento aos detalhes. A maneira como os outros observavam He Fan indicava liderança — talvez não formal, mas respeitada.

— Meu nome é Ryouma.

Os olhos de He Fan brilharam por um momento. Um brilho sutil, talvez de reconhecimento. Ou desconfiança.

— Há rumores de que o Mestre da Seita Tang está enviando discípulos para o interior do continente. Recrutamento silencioso, dizem. E espiões. Está relacionado a você?

Ryouma manteve a expressão neutra, mas a pergunta acendeu um alerta.

— Não estou associado à Seita Tang — disse com firmeza. — Meu caminho não segue a doutrina deles.

Um silêncio respeitoso se instalou. He Fan apenas assentiu.

— Então é um homem livre. Bom. São tempos perigosos. Temos recebido notícias de que as bestas espirituais estão ficando mais agressivas, como se algo estivesse... mudando.

Ryouma sentiu um arrepio. Havia algo que ainda não conseguia compreender, mas a sensação de que o mundo espiritual estava em descompasso era real. Desde que despertara seus dois espíritos marciais, percebera sutilezas nas energias ao seu redor que antes não conseguia captar. As correntes do mundo pareciam inquietas.

He Fan o conduziu até uma pequena hospedaria, onde uma senhora idosa o recebeu com simpatia e chá quente. O lugar era modesto, mas limpo. E, por mais contraditório que parecesse, ali, em meio à calmaria, foi onde ele finalmente sentiu a tensão começar a ceder.

Naquela noite, enquanto o fogo crepitava na lareira e a lua subia alto, Ryouma abriu o painel mental de seu sistema.

[Sistema de Refinamento de Esforço – Ativo]Análise de Progresso:Espírito Marcial 1: 53% RefinadoEspírito Marcial 2: 45% RefinadoDomínio Corporal: 39%Resistência Espiritual: 41%Habilidade Passiva Nova Desbloqueada: Sentido de Sincronia Espiritual

Uma habilidade passiva?

Ele clicou no nome, e uma nova janela apareceu:

Sentido de Sincronia Espiritual – Permite ao usuário captar variações nos fluxos espirituais do ambiente, detectando desequilíbrios, presenças ocultas e locais de energia concentrada.Efeito secundário: aumenta a sensibilidade emocional ao ambiente espiritual.

A conexão com Mayumi. A sensação de que algo o chamava nas profundezas da floresta. O frio nas costas ao entrar em Yunlan. Tudo fazia sentido agora. Ele estava sentindo mais do que apenas o mundo físico — estava começando a perceber as reverberações do mundo espiritual.

Enquanto refletia, uma batida suave à porta o tirou dos pensamentos.

— Entre.

A porta rangeu, revelando uma figura jovem, de cabelos castanhos claros e olhos escuros. Era uma garota, talvez dois ou três anos mais nova que ele. Trazia nas mãos um prato com pão e sopa, mas seus olhos carregavam uma timidez inquieta.

— Meu nome é Lin Xue — disse, com voz baixa. — Minha avó pediu que eu trouxesse sua refeição.

Ryouma agradeceu com um leve aceno.

— Obrigado, Lin Xue.

Ela hesitou por um momento, mas então perguntou, quase num sussurro:

— Você... é um mestre espiritual, certo?

Ryouma levantou os olhos.

— Sim.

— Então... pode me dizer por que o céu parecia tão pesado ontem à noite? Minha avó disse que era um presságio.

Ryouma fitou a janela. A lua parecia mais pálida do que o normal. Algo estava vindo. Algo que talvez nem os mais sábios pudessem prever.

— Às vezes, o mundo respira diferente antes de uma mudança — disse, depois de um longo silêncio. — E algumas pessoas, como sua avó, conseguem ouvir esse suspiro.

Lin Xue o olhou com admiração misturada a medo.

— A senhora disse que um espírito antigo desperta nas montanhas. Que aqueles que ouvirem o chamado poderão mudar tudo… ou destruir tudo.

Ryouma se levantou devagar, os olhos presos ao luar.

Talvez a jornada estivesse prestes a mudar novamente.

E dessa vez... ele não estaria apenas lutando contra outros homens. Estaria lutando contra os ecos mais profundos do mundo — e talvez contra ele mesmo.

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