O céu estava em completa dissonância. As nuvens se moviam em espirais frenéticas, arrastadas por forças invisíveis que rasgavam o tecido da realidade. A presença de Kael era como uma sombra que engolia tudo ao redor, e o ar, antes fresco e revigorante, agora estava pesado, como se o próprio ambiente estivesse sendo comprimido. A tensão entre Ethan e Kael aumentava a cada segundo, como se o mundo estivesse à beira de um precipício.
Kairo estava em silêncio, seus olhos fixos em Kael com um misto de temor e desprezo. Ele sabia o que Kael representava, mas a verdade ainda não havia sido completamente revelada. O Elo Gêmeo pulsava dentro dele, e uma sensação de urgência tomava conta de seu corpo, como se o tempo estivesse se esgotando.
Kael se aproximou lentamente, cada passo seu reverberando como um trovão distante. Sua presença não era apenas ameaçadora, mas quase opressiva. Ele era uma força, um catalisador que havia aguardado pacientemente a sua vez de se manifestar.
— Você ainda não entende, Ethan. — A voz de Kael ecoou no ar, profunda e cheia de camadas de conhecimento proibido. — O Elo Duplo não é um poder que você pode controlar. Ele é um reflexo do caos primordial, algo que transcende o tempo e o espaço. Quando o Elo Primordial despertar completamente, ele consumirá todas as linhas temporais e todas as existências. Não haverá mais passado ou futuro, apenas o vazio.
Ethan apertou os punhos, uma sensação de raiva crescendo dentro dele. As palavras de Kael soavam como uma sentença de morte, mas algo dentro dele se recusava a aceitar isso. Ele não queria ser o arauto da destruição. Ele não queria ser a peça final no jogo de poder de Kael.
— Você está mentindo. — Ethan disse com firmeza, tentando esconder o medo crescente que se formava em seu peito. — Eu não vou deixar você fazer isso.
Kael sorriu, um sorriso que parecia carregar séculos de sofrimento e sabedoria.
— Você ainda não entendeu a verdadeira natureza do Elo Duplo. Ele não é apenas uma arma de destruição. Ele é a chave para a reconstrução do universo. O ciclo está se fechando, Ethan. Não há mais como evitar o que está por vir.
Ethan sentiu uma dor lancinante na cabeça, como se as palavras de Kael estivessem penetrando diretamente em sua mente. Ele tentou afastar a sensação, mas foi em vão. As memórias começaram a se formar à sua volta, fragmentos de uma vida que ele não lembrava. Vidas passadas, momentos que nunca viveu, mas que pareciam tão reais quanto sua própria existência.
Ele viu Kael. Viagens através de mundos destruídos, ruínas de civilizações antigas, e uma figura encapuzada que observava o abismo com um olhar de derrota. Um ciclo interminável de destruição e recriação.
— Você está vendo, não está? — Kael disse, sua voz agora mais suave, como se estivesse falando diretamente dentro da mente de Ethan. — Nós dois fomos feitos para este momento. Eu, como o guardião do Elo Gêmeo, e você, como o portador do Elo Duplo. Nós não somos inimigos, Ethan. Somos dois lados de uma mesma moeda.
Ethan caiu de joelhos, a dor era insuportável. Sua mente estava sendo invadida, e ele não sabia mais o que era real e o que era uma ilusão criada por Kael. Mas algo dentro dele, uma centelha de resistência, começou a brilhar. Ele não ia se deixar consumir por essas memórias distorcidas. Não ia se deixar ser manipulado.
Com um esforço desesperado, Ethan se levantou, sua aura vibrando ao redor dele como uma tempestade prestes a explodir.
— Eu não sou você, Kael. Eu não vou aceitar o que você está oferecendo.
A marca do Elo Duplo brilhou com intensidade, e uma onda de energia varreu o campo, afastando Kael por um instante. A dor em sua cabeça diminuiu, mas a sensação de que ele estava em um abismo sem fundo não se dissipava.
Kairo, que havia permanecido em silêncio até aquele momento, finalmente deu um passo à frente. Seus olhos estavam cheios de algo que Ethan não conseguia identificar, mas sabia que não era simplesmente desprezo.
— Ethan, você não pode fazer isso sozinho. O Elo Primordial já começou a se manifestar, e o tempo está se fechando.
Ethan olhou para Kairo, a dúvida em seus olhos. Ele sempre tivera desconfiança do que Kairo realmente queria, mas agora parecia que ele tinha algo mais importante a dizer.
— O que você sabe sobre o Elo Primordial, Kairo?
Kairo olhou para o chão por um momento, como se estivesse ponderando as palavras a serem ditas. Quando finalmente olhou para Ethan, havia uma sinceridade em seu olhar que ele nunca havia mostrado antes.
— O Elo Primordial não é só uma força de destruição. Ele tem o poder de moldar o universo. Ele pode criar novas realidades, alterar o curso da história, e até mesmo ressuscitar aqueles que já partiram. — Kairo fez uma pausa, sua expressão mais séria do que nunca. — Mas ele também tem um preço. Quando o Elo Duplo e o Elo Gêmeo se encontram, ambos os portadores são consumidos. E a realidade, como conhecemos, se desfaz.
Ethan engoliu seco. A revelação de Kairo fez tudo parecer ainda mais insuportável. O que ele temia estava mais próximo do que nunca. O Elo Primordial não seria apenas uma ameaça para ele. Ele destruiria o mundo inteiro, tudo o que ele conhecia. O preço da reconstrução seria a própria existência.
— E você está disposto a pagar esse preço, Kairo? — Ethan perguntou, a raiva voltando a crescer. — Você quer ser parte disso?
Kairo não respondeu de imediato. Seu olhar se suavizou por um momento, como se estivesse olhando para o futuro de um jeito que Ethan não conseguia entender.
— Não se trata do que eu quero. Se você não se unir a mim, a destruição será inevitável. O Elo Primordial não se importa com desejos ou intenções. Ele só quer... renascimento.
Ethan olhou para Kael, que observava tudo em silêncio. A pressão ao seu redor se intensificava, como se o próprio tempo estivesse sendo comprimido.
— Eu não vou me render. — Ethan disse, com uma determinação inabalável.
Kael levantou uma mão, e uma onda de energia negra irrompeu do portal atrás dele, rasgando o ar com uma força imensurável.
— Você não tem escolha, Ethan. O Elo Primordial já fez a escolha por você.
Antes que qualquer um pudesse reagir, uma figura apareceu no horizonte. Uma silhueta familiar que avançava com passos rápidos, como se soubesse exatamente o que estava acontecendo. Ethan sentiu um arrepio na espinha ao reconhecê-la.
Era Ireth.
Ela estava sozinha, mas a sua presença parecia alterar o próprio espaço ao redor dela, como se ela fosse um ponto de anomalia em um universo que já estava se desintegrando.
— Ireth… — Ethan murmurou, sem saber se isso era uma boa ou má notícia.
Ireth se aproximou rapidamente, e sua voz, fria e cortante, soou no ar.
— Eu disse que o tempo se fecharia. Mas há algo que Kael não sabe. O Elo Primordial pode destruir tudo, mas ele também pode ser parado. Se você souber onde acertar.
Os olhos de Ethan brilharam com uma nova esperança, mas a tensão não se dissipou. O final do ciclo estava chegando. A verdadeira batalha começava agora.